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Proteger os territórios indígenas é o objetivo de uma nota técnica (NT) elaborada por seis organizações que integram a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida. O documento propõe diretrizes para um instrumento normativo que declare e garanta tais áreas como zonas livres dessas substâncias, além de proibir sua pulverização em todo o país, como alguns estados e municípios já fizeram.
Partindo do contexto histórico, a NT 1/2025 destaca os impactos desses produtos na população brasileira – em especial os grupos sociais em maior vulnerabilidade – e no meio ambiente. O texto mostra como o uso em larga escala de agrotóxicos se instalou no mundo e no Brasil; como vem sendo barrado em diversos países, mas mantido no Sul global; os efeitos documentados no corpo humano, no solo, na água, na fauna e na flora; e a subnotificação dos problemas causados.
Ali também constam casos documentados – inclusive de pulverização deliberada sobre os moradores e moradoras – em terras indígenas (TIs) e retomadas. “Na Retomada Guyraroká e em todo o país, o uso de agrotóxicos é arma de guerra contra os povos indígenas: envenena alimentos e rios, adoece os corpos, inviabiliza os modos de vida tradicionais”, afirma Ingrid Martins, que integra a Coordenação Jurídica da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).
As entidades proponentes da nota técnica sublinham que a poluição química viola o núcleo fundamental dos direitos sociais, ao impedir o o à alimentação adequada, à saúde e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. Uma combinação que afronta diversos tratados internacionais dos quais o Brasil faz parte.
Contra esse quadro, o estudo recomenda a criação de um instrumento regulatório que:
“É hora de o Estado brasileiro reparar os danos e regulamentar zonas livres de agrotóxicos ao redor das comunidades indígenas”, defende Ingrid Martins. Ele lembra que a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) reconheceu que essa prática viola os direitos dos povos. “No mesmo sentido, a Apib acionou o STF [Supremo Tribunal Federal] para exigir medidas concretas da União.”
Com a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 92, protocolada em abril, a entidade questiona a ausência de regulamentação específica que proíba a pulverização aérea de agrotóxicos no país. A Campanha Contra os Agrotóxicos, a Terra de Direitos, a FIAN Brasil e o Instituto Preservar pedem ao Supremo para atuar como amici curiae (“amigos da corte”) no julgamento da ADO, que tem como relatora a ministra Cármen Lúcia. Também assinam o pedido a Confederação Nacional dos Trabalhadores Assalariados e Assalariadas Rurais (Contar) e a Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras do Estado do Maranhão (Fetaema). Até o momento, não há previsão de julgamento da ação.
Construção coletiva
Ao lado da própria Campanha Contra os Agrotóxicos, a NT 1/2025 foi elaborada de forma coletiva por FIAN, Apib, Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Ceará, Instituto Preservar e Terra de Direitos.
“A elaboração da nota se deu a partir de audiência realizada em agosto de 2024, convocada pela deputada federal Célia Xakriabá [Psol-MG], em que foram apresentadas pesquisas que evidenciam os graves impactos dos agrotóxicos no nosso país”, conta a assessora de Advocacy da FIAN Maíra Miranda. “É um documento estratégico com o objetivo de contribuir para o aprofundamento do debate, especialmente após o pedido da parlamentar de criação de um Plano Nacional de Fiscalização dos Impactos dos Agrotóxicos nas Terras Indígenas.”
Durante o 21º Acampamento Terra Livre (ATL 2025), como parte do Abril Indígena, o documento foi entregue à Secretaria de Saúde Indígena (Sesai) e à Coordenação Geral de Vigilância em Saúde Ambiental (CGVAM) do Ministério da Saúde.
“A nota traz subsídios importantes para avançarmos em legislações que garantam sobretudo a vida dos territórios indígenas e demais povos e comunidades tradicionais, um instrumento para a exigibilidade de direitos frente às inúmeras violações e impactos. Seu conteúdo dá sustentação e reforça a necessidade da implantação de territórios livres de agrotóxicos”, avalia a integrante da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida Fran Paula.
Uma das proposições recentes nessa linha é o Projeto de (PL) 4.636/2024, de Célia Xakriabá. O PL propõe alterações na Lei Orgânica da Saúde (Lei 8.080/1990) para aumentar a proteção das comunidades diante do problema em questão. O PL aguarda análise na Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara.
Múltiplos danos
“Os ingredientes ativos encontrados nas terras indígenas são carcinogênicos, teratogênicos e mutagênicos, e causam possíveis danos à pele, ao aparelho digestivo e ao aparelho reprodutor humano”, alerta a pesquisadora da Fiocruz Ceará Fernanda Savicki. Ela cita dossiê lançado no ano ado pela fundação e pela Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco). “Também podem causar impactos ambientais como perda de biodiversidade aquática, modificação na florada e frutificação de árvores arbóreas, contaminação da fauna, eliminação de macro e microrganismos no solo e grandes baixas entre as espécies polinizadoras.”
Para o professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Emiliano Maldonado, membro do Instituto Preservar, “a NT sistematiza uma série de informações e dados científicos que demonstram a gravidade da situação vivenciada pelos povos indígenas no que se refere às contaminações geradas pela pulverização aérea”. Maldonado, que também faz parte da Campanha Contra os Agrotóxicos, conclui: “É fundamental que o poder público tome as medidas necessárias para proibir esse tipo de prática poluidora”.
“O Estado Brasileiro deve se responsabilizar pelo diagnóstico, registro e tratamento das intoxicações por agrotóxicos no país, especialmente quando se trata de populações vulneráveis expostas a eles”, afirma a advogada popular Jaqueline Andrade, da organização Terra de Direitos. “O que temos hoje é um cenário de subnotificação que impacta diretamente a formulação de políticas públicas, a capacidade e as ações dos municípios e estados em garantir saúde à população.”